Os amigos não acreditavam nele. “Meu sonho era passar na televisão. Quando fui pra SomZoom, participei de um show de calouros, na TV, e não tinha celular para comprovar aos meus amigos que tinha aparecido”. Agora não precisa mais provar nada. O baterista da banda Aviões do Forró é tão visto quanto falado. Talvez nenhum outro baterista no Brasil seja tão conhecido quanto Francisco Pedro Alves Dário. Não com esse nome, mas com o apelido de Riquelme.
Os bordões “Taca o pau, Riquelme!”, “Riquelme na batera” e, simplesmente, “Riquelme!” ajudaram a transformar o cearense de Iguatu em referência do forró moderno. “Ele revolucionou o forró”, chegou a dizer a estrela baiana Ivete Sangalo, em programa de rede nacional, fazendo menção ao ritmo que o baterista passou a dar aos sucessos do grupo Aviões do Forró. É o reconhecimento de uma caminhada que começou cedo, quando ele sequer tinha noção do que a paixão pelo instrumento poderia lhe dar.
Nas horas vagas, “Pedrinho” assistia a ensaios de bandas locais e ouvia rock internacional. Fazia barulho tocando em uma bateria improvisada com panelas e baldes. “Não tinha oportunidade de ter o instrumento de verdade, pelas condições financeiras da minha família. Improvisei uma bateria feita de lata, panela e o que tivesse lá em casa. Minha mãe reclamava porque eu amassava tudo”, lembra Riquelme, hoje com 38 anos de idade.
Autodidata, acabou tomando gosto pela coisa, mal sabendo que, anos depois, seria o melhor e mais conhecido baterista de forró do Brasil. Tudo começou em Iguatu, quando pediu para tocar bateria em uma banda da cidade, chamada Lírios. “Me deixaram tocar em uma bateria de verdade. Ficava tão feliz que não parava nem para almoçar. Com quatro meses, eu já comecei ‘profissionalmente”.
Aos 14 anos, teve de se mudar com o pai para Quixadá, no Sertão Central. Lá, a sorte começou a sorrir para ele. Surgiu a oportunidade de se tornar baterista da Banda Azul, da qual era fã. Mas ele queria mais. Em busca do sonho de um dia aparecer na televisão como baterista, viajou para Fortaleza com R$ 20 no bolso e sem ter onde ficar.
Dormiu na guarita da antiga rádio Somzoom (hoje A3 Entretenimento). Valeu a pena. Ao amanhecer, recebeu a notícia que buscava. “Falei com o produtor Ferreira Filho [da banda Mastruz com Leite], avisei que estava parado e, por coincidência, um baterista que tocava no estúdio estava saindo da equipe”. Na mesma semana, fez um teste e conseguiu ser batera da Banda Aquários. Não parou mais. Passou pelas bandas Cavalo de Pau, Calango Aceso, Mastruz com Leite e Dorgival Dantas.
Faltava o nome artístico. Os amigos diziam que não dava para fazer carreira como “Francisco Pedro”. O “Riquelme” veio por acaso, e faz referência ao jogador argentino de futebol, Juán Riquelme. “Tava passando o jogo do Palmeiras contra o Boca Juniors [time pelo qual atuava o argentino], e eu só ouvia o narrador falando ‘Riquelme’. Decidi: ‘taí, coloca Pedro Riquelme”, lembra, fazendo questão de esclarecer que o seu time do coração é o São Paulo.
Aviões do Forró
Anos depois, em 2002, recebeu o convite do empresário Isaías Vieira para fazer parte da banda nova Aviões do Forró. Teve receio em aceitar e trocar o certo pelo duvidoso. A segunda oferta tornou-se irrecusável, segundo Riquelme, e ele resolveu apostar na sorte. “Ganhava R$ 100 por semana, e me ofereceram R$ 150 e o aluguel da minha casa. Aceitei, e foi a melhor escolha da minha vida. Deus disse: ‘agora chegou a sua vez”, comemora.
“Ganhava R$ 100 por semana, me ofereceram R$ 150 e o aluguel da casa. Aceitei, e foi a melhor escolha da minha vida” (Riquelme, baterista do Aviões do Forró)
Dono de um carisma inigualável, tornou-se o baterista da banda comandada por Xand e Solange Almeida, que hoje está entre os maiores grupos do Brasil. Com a proposta de fazer diferente e dar uma batida mais lenta e dançante ao forró que era executado nas rádios, Riquelme é considerado por muitos o responsável por revolucionar a maneira de interpretar o estilo. “Antes era mais vanerão, mais ligeiro. O Aviões veio com essa característica. Eu puxei essa batida como se fosse um forró com pagode. Misturei as duas levadas e a maneira de tocar”.
As experiências anteriores e o gosto por ouvir todo tipo de música é o que, segundo ele, influenciam sua forma de tocar bateria. “Eu sinto a música e vou mudando. Muitos ouvem você tocar e copiam. Eu mudo tanto, que as vezes tento repetir o que fiz, e não lembro mais”, brinca.
“O Alexandre [Xand] dizia que não ia chamar o sanfoneiro, ia chamar o baterista. Aquilo começou a me dar mais estímulo. Os bateristas passaram a ser mais valorizados. A galera chama o meu nome nos shows. Agradeço demais por isso, me sinto muito feliz”. Outra peculiaridade do grupo, que surgiu de uma ideia do vocalista Xand, foi a de dar destaque ao baterista, em contrapartida ao costume dos cantores de evidenciar os sanfoneiros. “Riquelme! Simbora, meu batera” virou o principal bordão do Aviões do Forró e levou o nome do cearense aos quatro cantos do país, tendo ficado conhecido entre fãs e cantores de renome, como Ivete Sangalo, Bell Marques, Gusttavo Lima e Jorge e Mateus.
Fazendo em média 4 shows por semana, já gravou CDs, DVDs, participou de festivais, turnês na Europa e nos Estados Unidos. “O cansaço existe, mas acho que é mais psicológico. Quando sento para tocar, alguma coisa me acorda ali. Gosto tanto, a banda é tão unida que, na volta das viagens, já começo a sentir saudade”.
No Aviões há 13 anos, Riquelme conseguiu comprar um apartamento, um carro e trazer o pai para morar na capital cearense. Casado com Thamyres Oliveira e pai de dois cachorros, como ele próprio brinca, não consegue imaginar a vida sem o grupo – da mesma forma que não consegue esquecer a caminhada que trilhou até chegar onde está.“Quando eu estava nas outras bandas, não tinha nenhum real para pagar o ônibus. Uma vez, tive que andar da Vila Manoel Sátiro até o Castelão [cerca de 10 quilômetros] a pé, sem poder comprar uma água. Uma vez me perguntaram se eu tinha almoçado, e eu disse que sim; mas, na verdade, a barriga estava vazia”, lamenta.
Muitos ensinamentos que não teve na escola – cursou apenas até a 3ª série –, a vida tratou de lhe mostrar. Hoje Riquelme é a própria aula de superação e de força de vontade. O garoto que tinha o sonho somente de aparecer na televisão conseguiu ir muito mais além, com duas baquetas na mão. “Eu consegui tudo o que não tinha. Deus sempre iluminou meus caminhos”. A luz que recebeu, ele retribui em ritmo, levando alegria ao público. “Riquelme!”
Fonte: Tribuna do Ceará