Direção: Clint Eastwood
Resenha
O filme As pontes de Madison retrata de forma anacrônica a história de amor entre uma dona de casa, casada, mãe de dois filhos, e o fotógrafo de uma revista científica. O romance aconteceu durante quatro dias, enquanto o marido e os filhos estavam fora, mas com uma intensidade que permaneceu por três décadas, até a morte dos dois.
Francesca é uma italiana que vive, em uma fazenda em Iowa, com o marido e os filhos. Uma dona de casa que divide seu tempo entre os afazeres domésticos e os labores da fazenda. Sua família viaja para participar de uma feira de animais e, nestes dias surge o desconhecido Robert, que vem quebrar a rotina do ambiente rural em que Francesca vive mergulhada.
O repórter chega à fazenda para pedir informação sobre a localização das pontes, onde ele ia captar as imagens. Francesca o acompanha para mostrar o local e a partir deste encontro vai se costurando uma amizade com toques sutis de sedução e erotismo. Robert é um homem aventureiro que não possui família nem laços que o prenda. Leva uma vida nômade, vai aonde a câmera o leva.
Os dois personagens se sentem atraídos e o romance se concretiza. Entretanto a vida segue seu curso, pois Francesca não tem coragem de deixar a casa, o marido e os filhos para acompanhar o seu amor. Trinta anos depois ela morre e deixa um diário em três volumes, onde narra a história de amor para seus filhos. Os dois ficam surpresos com a confissão da mãe.
As pontes de Madison, não é apenas uma história de amor hollywoodiana carregada no açúcar. O diretor Clint Eastwood soube traduzir com excelência, através da narrativa visual, os sentimentos de uma mulher. Além da direção, ele protagonizou o filme. E, para quem estava acostumado a vê-lo na pele de durões empunhando uma arma, foi surpreendido com a sensibilidade de um fotógrafo de borboletas e um amante apaixonado que o ator desempenhou.
Francesca, interpretada brilhantemente por Meryl Streep, vivia só para a família, até mesmo o trabalho de professora foi levada a deixar, porque o marido não gostava. Os filhos mal se importavam com ela. A mulher tinha se transformado apenas numa utilidade doméstica sem vida própria. Isto fica bem claro numa cena em que ela se esmera preparando o jantar e a família apenas se senta à mesa e comem.
Outra situação que merece ser ressaltada na cena do jantar, é que Francesca está na cozinha ouvindo uma música no rádio e, quando a filha entra, muda de estação como se a mãe nem existisse. Os filhos e o marido se sentam à mesa, comem de maneira automática e nenhum deles se dirige à mulher. Ela os observa como se esperasse algum esboço de agradecimento.
Esta película é o retrato de muitas mulheres “comuns” que vivem imersas na rotina familiar sem tempo para se perceber e ser. Quando Robert aparece naquele lugar “no meio do nada” e a enxerga, dá a atenção, da qual ela carecia, é como se ela se olhasse no espelho e entendesse que ainda era uma mulher viva e com desejos. Ele a ajuda com o jantar, se oferece para lavar a louça e, acima de tudo, a escuta. Quer saber de sua vida e se importa com ela.
O que despertou em Francesca o sentimento por Robert não foi apenas a carência, mas todo este clima novo que ele trouxe para seu ambiente monótono. Ele não precisou tirá-la de dentro de seu casulo, ela se percebeu borboleta no seu espaço, onde era somente mãe e dona de casa. O fotógrafo trouxe um flash e, Francesca se descobre mulher ainda. Vemos isto na cena em que ele está se asseando, ela o observa e, se recrimina.
Outra temática que é apontada na narrativa é a questão dos filhos não compreenderem que mãe também é mulher. E o filho fica indignado com a possiblidade de a mãe ter feito sexo com o Robert, afinal com o pai não seria sexo, seria obrigação de dona de casa? Ele acredita que o amante era um sedutor de mulheres indefesas e que a desvirtuou. Principalmente quando recebe o pedido da mãe para ser cremada e as cinzas espalhadas sobre a ponte.
A história é tão interessante que até os filhos, que ao início estavam decepcionados com infidelidade da mãe, principalmente o filho homem que se sentia traído, por fim acabam compreendendo a história e a posição dela o que, os ajudam nas tomadas de decisões. Eles decidem sair da rotina, da vida mecânica e valorizar mais os sentimentos.
O diretor conta a história, sob o ponto de vista da mulher, de maneira sutil e delicada. Ele também conduziu com maestria as cenas mostrando suavemente o clima de romance e erotismo entre os protagonistas. Os atores coroaram com uma belíssima interpretação, a cena de amor na casa de Francesca. Os olhares, a respiração, gestos e palavras, tudo coreografado sensualmente retratando o desejo e a paixão do casal.
Um filme que traduz a alma feminina, a mulher, que não é nada comum, como disse Robert a Francesca, vai entender mais que qualquer outro expectador. As pontes. Estas simples estruturas de madeira se tornaram símbolo daquele amor indestrutível e os dois deixam o pedido para que suas cinzas sejam espalhadas sobre o local representando uma forma de libertação e eternização de seu Amor.