Basta dar uma meia volta pelo Mercado Municipal de Picos e arredores, para sentir de longe o cheiro de especiarias e ervas medicinais. Assim como os camelores tradicionais das calçadas picoenses, os farmacêuticos do sertão têm seus lugares cativos nas esquinas barulhentas.
De tudo tem na barraca do seu Ném, a cura através das plantas. Cascas de árvores, sementes e flores para os mais variados males que acometem o sertanejo. Variados também, e desconhecidos, porém de grande confiança da clientela, são os “princípios ativos” das mil e umas garrafadas.
Os fracos de medicamentos, e essências, cheios de pó e velhos quanto a dor do poeta português, estão exposto ao clima, nada europeu. Não se sabe se a temperatura estraga ou aperfeiçoa o medicamento. Ninguém sabe os segredos dos cientistas da calçada. Nem eles mesmos. Ciência, apenas ciência!
Ao aproximar-me da barraca, o vendedor percebe minha curiosidade. Atencioso começa a explicar-me de que se trata cada composto. “ mel de jataí, pra catarro mal curado”. “amexa com barbatimão pra inflamação do útero e ovário” a lista é imensa. Tem até o famoso viagra natural: a tradicional catuaba.
Acredita-se que o valeguaribense herdou, talvez inconscientemente os costumes dos croás e Jaicós, nossos primeiros habitantes. Outra possibilidade de justificativa para tanto “dotô” da natureza é que, antes, as possibilidades de encontrar um médico e uma farmácia pela região eram bem escassa.
Ali, na banca do curandeiro, também funciona um consultório de terapias alternativas. Troca de informações sobre receitas medicinais e até de novos males. O vendedor só não revela, se dentro dos potes e saquinhos de cascas moídas e processadas, tem mais, ou menos que o indicado no rótulo.
Tem de tudo, mata barata, mata rato e se alguém tiver em casa aquele menino lombrigueto, mata… Lombriga também. Casca de catingueira para congestão, bucha de polista para sinusite, casca de romã cura inflamações, óleo de rícino pra purgar o intestino e especiarias, cravo, canela, nanuscada anís e pixurís.
Herdei de minha mãe esta admiração e crença na medicina natural, sempre que tenho oportunidade, dou uma passada por estas farmácias folclóricas e compro algumas cascas e sementes. Também tenho minha parcela de loucura e de médico. E, jogo tudo dentro de uma garrafa de vinho branco.
Mas ainda tem um ritual para se tomar o composto. Depois de uns quinze dias vinhado, toma-se um pequeno cálice e entra debaixo do chuveiro. Pode não curar muita coisa, nunca parei para calcular os benefícios, mas a sensação do álcool tomado se espalhando pelo corpo junto com a água, é um bálsamo.
Maria Nilza de Carvalho